quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O incêndio da Feira de Água de Meninos



As feiras livres de Salvador são um assunto sobre o qual estou desejando falar, mas há pouco material disponível para mim, ou, pelo menos, ainda não o encontrei. Acho que já se falou de tudo. De certa forma, as feiras populares ficaram esquecidas. Poucas pessoas se interessaram pelo assunto, sem que tivessem feito a divulgação das suas histórias...que são, no mínimo, interessantes . De feiras populares tivemos uma importante e famosa que fez parte da história da cidade e agora temos a sua continuação , porém não na forma que seria desejável e definitiva.Estou me referindo, primeiramente , à Feira de Água de Meninos e , como não poderia deixar de ser, à de São Joaquim, ambas na parte baixa da cidade, ocupando terrenos juntos ao mar.A feira de Água de Meninos, não existe mais . Foi totalmente consumida pelo fogo e em seu lugar, anos depois , surgiu a de São Joaquim, um pouco mais adiante, que continua sendo a grande feira popular onde a população de baixa renda se abastece a preços convidativos , mas com algum sacrifício, pois as instalações são de barracos, caixotes , balaios, esteiras, e até sacos de aninhagem espalhados pelo chão com as mercadorias . Ali tem de tudo o que você possa imaginar...! Alguns saveiros, dos quais ainda restam, chegam diretamente à feira e entregam as mercadorias aos comerciantes, eliminando atravessadores , o que possibilita preços melhores... Mas eu já me adiantei um pouco, pretendo mesmo, é lembrar a feira de Água de meninos , que conheci pessoalmente. Era uma cidade de barracos de todos os tipos, dentro de Salvador , um verdadeiro labirinto , sobre um chão de terra, lama , limo , normalmente péssimo, imagine-se quando chovia. A Feira estava instalada sobre uma área aterrada , recuperada ao mar . Juntando-se a sujeira produzida pela própria feira, onde até mesmo animais eram abatidos e o seu sangue acabava misturado no solo com restos de tudo e cascas de frutas fermentadas , etc..A feira cheirava mal, muitas pessoas moravam nela, a quase totalidade dos feirantes, com famílias , e posso até mesmo afiançar que muita gente nasceu ali dentro ... Eu, com a minha mania de coisas da Bahia, novinho, recém- casado, um dos locais aos quais fiz questão de levar a minha jovem esposa, então com 23 anos foi, justamente, à Feira de Água de Meninos. Para mim, era o máximo, algo característico , coisa da terra , com a qual estava acostumado , mas , para a Paola , foi um desastre! Ela que vinha da Itália , que tinha morado em Grenoble, na França, e passado alguns anos em S.Paulo , morando em Santos, se apavorou quando viu o indivíduo suado, sem camisa , destrinchando um porco sobre uma taboa imunda e com uma enorme e afiada peixeira na mão , pés no chão no meio da lama !... Bem, continuamos o passeio depois deste meu desacerto, quase uma tragédia , e fomos para lá na Ribeira , uma das minhas paixões, com recordações de infância. Comprei um acarajé, mandei colocar pimenta e dei à Paola para experimentar...Nunca vi uma pessoa atravessar uma pracinha tão depressa ! Nem percebi e ela já estava no balcão da padaria pedindo um copo com água para apagar o incêndio da boca...Bem, vamos voltar à Feira de Água de Meninos ! Como disse, tinha de tudo, era o que hoje é São Joaquim , só que muito maior ...Mas, como sempre há um porém, se falava que a feira precisava sair dali . Conversas não adiantaram muito e, como sempre, acontece sem que ninguém saiba , nem como, nem porque. Houve uma coincidência (!). A cidade, evidentemente, não era a que é hoje...Naquela época, exatamente na área aterrada de Água de Meninos , estavam os depósitos de combustíveis para o abastecimento da cidade, da Esso, Texaco e Shell , aqueles tanques prateados enormes, que também deveriam sair do local , ou melhor da cidade ... numa noite que alguns insistem em dizer que era de lua cheia, no ano de 1964 , toda a feira ardeu numa fogueira só e eu acho que, se a lua estava cheia, era porque estava sendo iluminada aqui de baixo. Foi um fogaréu nunca visto em local algum com direito a explosões e a labaredas que, de repente, ganhavam as alturas , por pouco não queimando a lua ! Se estivesse um pouco mais pertinho... Os bombeiros, coitados, com o equipamento da época, mais a falta d’água e a dificuldade de entrar num labirinto cheio de lama e detritos, poucos ou quase nada puderam fazer. O mais prático foi mesmo esperar o fogo apagar por si, pois o que não faltou naquele incêndio fenomenal foi material inflamável , de fácil combustão , e iluminação...a própria fogueira iluminava o local. ! A fogueira, acho , podia ser vista da lua , do mesmo modo como a Muralha da China . Da Ponta de Itaipu, certamente. Lá do Alto de Santo António, sem dúvida e de outros pontos da cidade. Mas havia o temor de que boa parte da cidade viesse a explodir devido a vazamento de combustível dos tanques introduzido nos canos de esgotose galerias de água . Bastaria uma centelha e adeus boa parte da cidade baixa. Muita gente achou que o incêndio foi propositado e que serviu às duas finalidades. Os feirantes, como não podia deixar de ser, culparam a Petrobrás e começaram uma briga na justiça por indenizações , que nunca se resolveu . A feira de São Joaquim é a sucessora da de Água de Meninos e os tanques prateados , estão lá para as bandas de Mataripe...Em toda esta história, há uma coincidência estranha. Muitos prédios antigos do Centro Comercial que não podiam ser demolidos para a construção de novos , por serem considerados patrimônio histórico se queimaram espontaneamente , deixando os espaços para novas construções...Acreditam nisso ?Sarnelli ,10.12.2008Foto baixada da InternetNão deixe de visitar Salvador. As festa estão aí. Até fevereiro , é só festa !
Foto baixada da Internet

postado Sarnellii @ 06:49 0 Comentários
Quarta-feira, 10 de Dezembro de 2008

4 comentários:

Anônimo disse...

Olá Sarnelli,
Sou Simone, formada em turismo em mestranda em geografia pela UFBA. Fazendo uma pesquisa pela net, encontrei seu blog e gostei muito dos assuntos abordados, mas tem um em especial que me chamou mais a atenção... "O incêndio da Feira de Água de Meninos", por dois motivos, primeiro porque sou apaixonada por Feiras e segundo por minha dissertação de mestrado é sobre as feiras que surgiram na borda da Baia de Todos os Santos, a Feira da Rampa do Mercado, a do Cais Dourado, a do Sete, água de Meninos (como recorte histórico) e finalmente São Joaquim. Bom, gostaria de solicitar sua autorização para utilizar trechos do seu comentário em meu trabalho, e claro com as devidas referências. Não sei se mora aqui em Salvador ainda,mas adoraria marcar uma entrevista contigo. Meu e-mail é sms_costa@yahoo.com.br. Ficarei aguardando contato seu.
Um abraço,
Simone Costa

Anônimo disse...

Olá
Meu nome é Daniele Batista tenho 15 anos e estou fazendo uma pesquisa escolar,
Onde vamos fazer uma apresentação especial sobre a feira...Adorei seus comentarios sobre a feira e gostaria de pedir permição pra usar trechos do seu texto e o SR° poderia me dar algumas dicas pra meu trabalho e da minha escola que é de muita importancia.
Meu email é
daninha_lind@msn.com
Obrigada pela atenção!

Unknown disse...

Olá,a título de curiosidade:Porquê Água de Meninos?

Obrigada.
Teclemara@hotmail.com

Sarnelli disse...

Por que Água de Meninos ? Provavelmente, a história é mais ou menos essa :

Simplificando. A coisa é antiga e deveria ter sido mais o menos assim. Todos nós sabemos que boa parte da cidade baixa foi recuperada ao mar. A área ou bairro chamado Água de Meninos, fica entre o Pilar e São Joaquim. Sendo que espaço ocupado pelo mar, era, naturalmente , um prolongamento do porto e para onde se dirigiam os saveiros para o seu atracadouro e aguadas. Quem vê uma foto antiga da área, pode verificar que tudo era natural. Os saveiros entravam até onde hoje é a pista de rolamento e o espaço era cheio de irregularidades . Poças são o que não faltavam. Claro que a meninada não fazia por menos e aproveitava os espaços para se divertir inclusive jogando futebol e banhando-se . A área começou a ficar sendo conhecida como as águas dos meninos, como referência. Daí, provavelmente , o nome que o povo adotou. Nele , se criou, posteriormente , a feira de Água de Meninos, que ocupou uma grande área aterrada gradativamente e que durou anos. Um incêndio acabou com a feira , que mudou para outro local e recebeu o nome de Feira de São Joaquim. O nome que nasceu da boca do povo, permanece até hoje , apesar de estar tudo diferente , totalmente diferente , porque o espaço foi tomado ao mar e muitas transformações ocorreram por conta do progresso e necessidade de mais espaço para a cidade.
Deve ter sido esse o motivo que deu origem ao nome e nome que o povo dá a um lugar como referência , não há quem o mude . Pode até passar a existir num papel oficial , mas fica nele e em muitos casos são até oficializados. Sabia que temos a Rua do Tira chapéu ? A Rua da Forca e a Praia das Moças , que, na realidade ,deveria se chamar de Praia das Freirinhas ?
Pelo menos , foi isso que eu consegui saber e ver através dos tempos.É possivel que haja alguma criatividade nessa história , mas é crível !
Sarnelli 29.03.14