Histórias da aviação brasileira
Hoje li no jornal que a marca Varig irá sumir até abril de 2014. A Gol, atual dona da companhia, entende que os passageiros associam a marca Varig a aviões velhos e ultrapassados, mesmo sendo a frota composta por aeronaves novas e modernas.
Lendo isso, imediatamente
comecei a viajar no tempo e a lembrar da antiga Varig. Ela, como a Petrobras
ainda é, era um verdadeiro símbolo nacional.
Como dizia a propaganda, era
"uma estrela brasileira viajando pelos céus azuis do mundo",
anunciando à todos, que nós brasileiros éramos também capazes.
Em uma época em que o Brasil era apenas
futebol, carnaval e café, a Varig viria a se tornar um verdadeiro orgulho para
o Brasil.
Lembrei-me também do glamour que era viajar
por esta companhia aérea e em seguida me veio a triste lembrança da sua
falência. Isto me fez pensar como tudo na vida parece ser realmente instável,
mutável e impermanente.
A Varig, durante a sua
existência, chegou a se tornar uma das maiores e mais conhecidas companhias
aéreas privadas do mundo, concorria até mesmo com a grande PanAm dos
americanos.
Era famosa pelos seus
serviços de bordo e sempre primou pelo requinte. Na sua Primeira Classe, servia-se até caviar. Mas a Varig não era só
isso, não era só caviar e champanhe. A Varig era competência.
O treinamento de seu pessoal sempre
foi uma meta permanente da empresa. Ela não se preocupava só com os seus
pilotos e comandantes. Para isso, implantou um Centro de Treinamento
Operacional, conhecido internacionalmente como "Varig Flight Training Center", que era um centro
integrado para treinamento das
principais áreas operacionais da companhia, onde eram oferecidos mais de 60 cursos
diferentes.
Seu setor de Engenharia e
Manutenção era reconhecido pelo seu alto padrão técnico. Prestava serviços
também para diversas outras empresas nacionais e internacionais.
Durante os anos áureos, seus
escritórios de atendimento no exterior eram considerados verdadeiros consulados
extras-oficiais do país, pois prestavam os mais variados serviços de apoio ao
público brasileiro em viagem.
Apesar de toda a expansão da
empresa, incorporação de inovações tecnológicas, compra de aviões cada vez mais
novos e serviços sofisticados a Varig começou a apresentar balanços negativos.
Os atentados de 11de setembro que abalaram, de forma geral, toda a aviação
comercial do mundo, não pouparam a Varig.
Em uma tentativa de
recuperação, chegou-se até a mudar a sua identidade visual, adotando a famosa
"estrela dourada".
Com o aprofundamento da
crise, supostamente devido ao reflexo do congelamento das tarifas aéreas pelo
governo, nas décadas de 1980 e 1990, completadas por uma administração
ineficiente que não tomava qualquer atitude para evitar o crescimento da crise
e reduzir as dívidas da empresa, a Varig "voava" cada vez mais rápido
para a falência.
Nesta época, só o governo
federal devia mais de 4 bilhões de reais ao grupo. Além disso, a Varig começou
a perder espaço para outra empresas que
adotaram o modelo Low Cost que conquistou definitivamente o público brasileiro.
Após sobreviver por 79 anos,
em 2006 começaram as demissões, totalizando somente em um, dia mais de 5000
cortes de postos de trabalho.
A Fundação Ruben Berta, inicialmente chamada de Fundação dos Funcionários da
Varig detinha o controle acionário da companhia. O seu objetivo principal
era atuar como um fundo de previdência, prover benefícios médicos e
assistenciais aos seus
funcionários. A fundação também
tinha um caráter filantrópico possibilitando ao cidadão comum, o acesso a
medicamentos de necessidade vital sem similar no Brasil, oriundos dos Estados
Unidos e Europa. Ela assumia a intermediação entre pacientes e distribuidores.
Outro caso emblemático da aviação
brasileira foi o da Panair do Brasil, que após 35 anos de existência da
noite para o dia teve o seu fim decretado pelo governo.
A destruição desta companhia
teve a influência direta da política da época. Existia uma perseguição do
regime militar contra seus proprietários, estes também, donos da TV Excelsior,
que foi igualmente fechada por ordem da ditadura militar brasileira.
Ao contrário da Varig, a
Panair do Brasil tinha um acervo gigantesco que superava em muito o seu
passivo. Ela era dona da Celma, uma avançada
oficina de retificação de motores que é até hoje é a maior da América Latina, e
que atendia não apenas a Panair, mas também outras empresas e a própria Força
Aérea Brasileira.
A Panair do Brasil tinha
hangares equipados com tecnologia de ponta, de nível comparável a países de 1º
mundo, e uma rede de agências consulares instaladas nas mais importantes
capitais européias. Também era responsável por toda a infra-estrutura de
telecomunicações aeronáuticas do país e por boa parte dos aeroportos do
Norte/Nordeste, foram construídos com recursos próprios.
Os ex-funcionários da Panair
do Brasil tinham orgulho de trabalhar para aquela companhia e com o seu
fechamento, desde 1966, cerca de 400 pessoas passaram a se reunir anualmente,
para lembrar os velhos tempos, celebrar e rememorar as agruras e as glórias da
aeronáutica brasileira. Porém tudo isso virou passado, tudo virou pó, já não
existe mais.
A impermanência das coisas é
um fator natural da vida. Porém quando adicionamos a ela a política e grandes
doses de incompetência, geramos uma mistura que passa a ser um catalisador da
própria impermanência.
Isto foi o que aconteceu com
estas duas grandes companhias aéreas brasileiras. A partir destas ocorrências a
aviação comercial brasileira nunca mais foi a mesma.
Autor: Claudio Sarnelli]
Geólogo –
Salvador/Bahia/Brasil
Esta crônica foi escolhida
pelo Blog do Sarnelli , de tudo um
pouco, para ser postada
por ter sido uma das melhores recebidas até hoje. É tudo
história e não há nenhum desvaneio no texto do autor. De parte de tudo isso eu
mesmo participei e atesto a sua veracidade. Quantas vezes viajei na Varig,
Varig, Varig ... e outras companhias
como a Cruzeiro , Loide Aéreo
Brasileiro , Sadia ,Vasp ?
É apenas uma coincidência
que o autor seja nada mais nada menos o meu filho mais velho, o Claudio
Sarnelli mas e obrigatório reconhecer que foi bucar tudo isso no túnel do tempo
trazendo a matéria para o presente, à disposição de quem não teve a felicidade
de viver aquela época.
Para acessar diretamente o Blog do Claudio Sarnelli, cesse o link
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Claudio Sarnelli 25/10/2013