domingo, 13 de abril de 2014

A casa-navio que ninguém se lembra mais




A casa navio ( Blog do Dimitri )
Foto de Eduardo Augusto Kneese de Mello ( tomada por empréstimo )

A casa navio
No tempo em que o bonde de bandeira 16 indicava, como destino, a localidade de AMARALINA .  

 Ali era o ponto final. De lá . ele voltava para a cidade pelos mesmos trilhos e não havia nenhuma manobra a ser realizada para o retorno. Bastava inverter os espaldares dos bancos de madeira , baixar a régua de um lado e subi-la do outro , o motorneiro apanhar as suas manivelas e passá-las para o outro motor lá no que chamávamos de “ cozinha “ . e reiniciar o retorno. Em resumo, os bondes, pelo menos a maioria, tinham duas frentes... É que os antigos, antes de surgirem os “ camarões ( os fechados ), tinham dois motores ... É evidente e quase desnecessário dizer que os bondes não faziam “ marcha-à-ré” em nenhuma circunstância. Quando o espaço permitia, ele fazia volta numa pracinha sobre os seus próprios trilhos. Bem , mas meu foco é a casa-navio . Os bondes chegavam a Amaralina onde só havia um bar , e que ainda está lá até hoje, em frente ao local em que existe ou existiu o quiosque das baianas de acarajé; Não consigo entender porque descaracterizaram o típico, substituindo as palhas de cobertura , por plástico , dando-lhes um aspecto de tendas no deserto . Um belo passeio , era pegar um bonde no Rio Vermelho ou em qualquer outro lugar da cidade, desde que fosse o 16 , e ir tomar uma água de coco no bar de Amaralina. Gastávamos a tarde toda e o passeio estava completo. Também, naquela época , não éramos muito exigentes ! No final da linha do bonde 16 – Amaralina, só existia mesmo o bar já referido, um imenso espaço vazio e nada mais além de uma carreira de casas humildes, geminadas, baixinhas, telhas vãs , no local que hoje é a Rua Ubaranas.
 Ah, sim ! Com tanto espaço, não podia deixar de existir um campo de futebol que só tinha mesmo as traves de um lado e do outro informando que o espaço era um campo de futebol... Não existia mais nada além do que já foi relatado. Solo arenoso, vegetação baixa e muitos cactus num dos quais, por sinal, dei o meu primeiro tiro de espingarda.Por lá, ia-se caçar!  Meu avô e um amigo , um pintor , não pintor de paredes , mas pintor de verdade , um outro artista, tinham a mania de caçar por lá. Meu avô colocou uma  folha seca num espinho de mandacaru,  um cartucho na espingarda e me deu dizendo: toma, atira naquela folha! Eu era pequeno e baixinho. Devia estar no entorno dos meus 10 anos, no máximo. A única recomendação , foi a de que precisava manter a coronha da arma bem encaixada no ombro, por causa do retorno , mais conhecido como “ coice “. “ e ele me mostrou como deveria fazê-lo. Acertei o mandacaru,  mas não a folha. Mas já tinha sido uma grande vitória! Faltou pouco para eu cair sentado na areia...
Bem, mas voltando aos trilhos, vou falar da única curiosidade que existia no local. 

Um pouco afastada do final da linha do 16 e do bar, andando um pouco, alguns minutos, pela areia,  você chegava a uma casa construída sobre, digamos ,  um desnível do solo ,  o que a fazia ficar um pouco elevada com relação a praia . Era uma casa em formato de navio ! Na verdade era uma casa isolada naquele fim de mundo, como outra qualquer , mas o proprietário teve a ideia de murá-la como  se fosse o casco de um navio. Com a proa ( frente ,  para quem não sabe o que é a proa ) de frente para o mar. Dava a impressão de que era um navio prestes a ser colocado nas águas de Amaralina ( ou Pituba ?) para ganhar aquele mar azul imenso que estava à sua frente e correr mundo. A casa, como não podia deixar de ser, ficou famosa e virou curiosidade , mas, devido a dificuldade de divulgação e de transporte, poucas pessoas chegavam até lá.
A casa diferente e curiosa embora não houvesse uma delimitação de áreas  na época, deveria ter estado no que é hoje  esquina da Rua Pará com Av.Otávio Mangabeira . Era criança , evidentemente, naquela época,  e não era por tudo que me interessava e a coisa  , para mim, tinha uma importância relativa. Só me lembrei dela ontem, conversando com amigos de velhas datas. Pena que não tenha uma foto do jeito e do ângulo que eu gostaria de ter. Tomei uma emprestada do Blog do Dimitri que, certamente, me perdoará a liberdade , mas eu tinha uma historinha para contar e a foto veio mesmo a calhar .Existem algumas no ar,  mas não mostram exatamente o que eu vi e o que eu e lembro. A construção mostrava um navio prestes a ser lançado ao mar ... a enfrentar as ondas, violentas,  naquele pedaço.Não tenho idéia de quando foi construída mas, pesquisando, verifiquei que ela foi demolida por volta dos anos setenta... Precisava dar espaço ao progresso, que a tudo atropelou... Onde tudo era areia, hoje é um dos mais importantes bairros da cidade.
Ah, sim ! A casa pertenceu  ao Dr. Celestino Bureau , um conhecido urologista em Salvador.
Para mais informações , acessem o Blog do Dimitri.
                                                                             Sarnelli , 13 de abril de 2014
                                                                                  Salvador, Ba.

8 comentários:

Anônimo disse...

era realmente na rua Para, defronte a praia, no local aonde hoje tem um posto da petrobras.

abraçao,

Edmond

Cristiano Teixeira disse...

Bartolo, os seus relatos da vida baiana no passado, ricos em detalhes e cor, me causam nostalgia de um tempo em que não vivi pois só vim ao mundo no início da década de 60. Eles me fazem desejar ter nascido muito tempo antes. Muito bacana.
Abraço!
Cristiano Teixeira

Sarnelli disse...

Obrigado, Cristiano Manifestações como a sua me animam a forçar um pouco a mente e remexer no baú e no túnel do tempo , para fazer uma regressão e pinçar alguma coisa para os que não viveram a sua infância na mesma época que eu... Mas, vai ter mais, com certeza !

Sarnelli disse...

Recebido por mail e colado.
Gostei bastante desta maravilhosa postagem da casa Navio. Eu cheguei a conhecê-la quando ainda criança, falava-se que era a" casa de Dr. Bureau, o médico que cuidava de doença venérea". Como estamos falando de saudosismo, aproveito para falar do "Bar Gereré", que ficava no Largo de Amaralina, único bar de Salvador que ficava a noite toda aberto, fazendo com que todos os boêmios fossem terminar suas farras lá, onde era servido cervejas hipergeladas e bons tira-gostos. Isto na década de60,que eu cito no meu livro " Vidas em Conflitos".
Continue postando essas preciosidades.
Abraço fraterno.
Delson.

Adalberto 01 disse...

Sarnelli disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Sarnelli disse...

Um comentário foi removido por engano, mas a resposta é essa.

Adalberto , nao Tenho conhecimento dos limites dos bairros de Amaralina e ou Pituba. O que desejo é confirmar que o bonde de bandeira 16 , " AMARALINA", Ele ia somenté até onde existe hoje o quiosque das baianas e dali voltava. Era o fim da linha. A casa-navio ficava um pouco distante daquele largo, no sentido Amaralina/Pituba. Uns 300 metros, provavelmente, se não me falha a memória de criança. Esse fato não autoriza a imaginar que aquela casa estivesse na divisa dos bairros . Na minha opinião , ela devia estar no bairro de Amaralina,

Sarnelli disse...

Adalberto 01 deixou um novo comentário sobre a sua postagem "A casa-navio que ninguém se lembra mais":

Prezado Sarnelli
Interessante que hoje a noite chegando em casa deparei com meu Vizinho (colega do Colégio Militar década de 60) que me mostrou a foto da casa do navio. Então ficamos discutindo: Eu dizia que a casa do navio era a divisa dos bairros de Amaralina com a Pituba e ele dizia que Amaralina encerrava no largo do acarajé.
Pelo seu relato vi que eu tenho razão. Se o Bonde 16 fazia o fim de linha de Amaralina justamente na Casa do Navio, deduz-se que era a Divisa dos Bairros.
Forte abraço
Adalberto Pedroso