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O vizinho
sabido – Crônica
Quando
vim morar no endereço atual ,eu estava muito longe do centro da cidade e o
pedaço era como se fosse uma pacata cidade do interior onde se colocavam as
cadeiras nos passeios de casa para bater aquele papo com os vizinhos. Até mesmo
aos domingos, com um tabuleiro, podíamos
jogar partidas de dama , de xadrez, ou
mesmo dominó , tanto era o sossego reinante ...
O loteamento estava,
praticamente, no começo , e havia muitos
terrenos baldios aguardando as construções que seriam feitas sobre eles. Fui
vendo os terrenos desaparecerem e , nos espaços , surgirem casas, até que tudo
fosse ocupado e chegasse a ser a bagunça que é hoje ! E à medida que o tempo
foi passando , o centro da cidade foi chegando até nós até que engoliu o bairro
, não havendo mais aquela divisão e o sossego de outra era. Hoje é tudo uma
coisa só !... O que era a nossa cidade do interior, fundiu-se com o centro de
Salvador.
Bem aqui pertinho de casa havia uma
invasão conhecida com “ O buraco doce “ – Paralela ao rio que, da atual
Embasa, corre para o mar na Mariquita, e
perto dela foi que o meu pai comprou um terreno onde construiu
uma casa para ele , minha mãe e minha
irmã. Uma planta baixa , projetada para os três. Casa térrea e pequena.Com o
passar dos tempos , a coisa foi melhorando e a rua , que era um lamaçal só quando chovia , ganhou asfalto e , consequentemente , nome.
Construída a casa, tendo ido morar nela, meu pai ganhou um vizinho, aliás,
dois, mas vou falar apenas de um deles com o qual passou a não se dar. Meu pai
era um homem de rígidos princípios , à antiga e, se tinha uma coisa que ele não
suportava, era o comportamento desse tal vizinho. Todos nós sabemos que é
costume do baiano curtir o seu clima tropical e, nas zonas da orla e das
praias, andar sem camisa. Simplesmente sandálias, bermuda e calção e é assim
mesmo que nós curtimos o clima dentro das nossas próprias casas...O baiano, de
um modo geral, é moreno, bronzeado pelo
sol. Mesmo nos dias de céu nublado, não se consegue escapar dos raios
solares...É uma delícia andar sem camisa e estar à vontade. Mas, claro, há um
limite para tudo. A inimizade do meu pai com o vizinho tinha tudo a ver com a
ultrapassagem desse limite. O homem , era um tipo , casca grossa , de pouca
estatura e uma barriga gigante , que parecia uma imensa melancia , nada elegante e, além do mais, toda pintada
com sinais escuros, com tendência para o preto e, para piorar a situação,
sentia-se dono da verdade , só ele entendia de tudo e tinha razão e costumava
xingar as pessoas de burras e jumentos. Costumava aparecer no portão da casa do
meu “ papi” para conversar com a minha irmã e minha mãe, o que era o pior, ostentando aquela enorme barriga deselegante
e até certo ponto causando um leve constrangimento . A bermuda, por falta de
cintura, era sustentada na virilha , como o mico do realejo... ! Era um senhor
cuja idade nunca conheci. Um dia , baixou hospital com um problema qualquer ,
´passou uns dias, recebeu alta e
retornou para casa. Já estava aposentado e, portanto, freqüentava aquela área
que ia do seu portão ao nosso, sempre naquele traje . Mas ele tinha um problema
na rua com a meninada , que gostava de jogar bola na frente da sua casa , com a
gritaria inerente e ele, incomodado,
sempre enxotava a moçada . Quer dizer , relacionamento péssimo com a garotada ,
que, para se vingar . Jogava sacos de lixo para dentro da sua casa. Ele pensou
em resolver o assunto colocando um alambrado alto, foi quando a meninada
resolveu jogar bombas de São João que poucavam dentro de sua casa , mas o tempo passou e
parece que a coisa se resolveu por conta própria. Um lance interessante,
porque a meninada sempre que podia, mexia com ele, foi quando ele, na porta de
sua casa , sempre com o barrigão de fora, viu passar um carro e os seus
ocupantes gritaram: espanhol, fdp ! A sua
reação (risível) foi rir e dizer: isso não é comigo! Eu não sou
espanhol... ! Nesse tipo de relacionamento , a vida ia em frente até o dia em
que ele atacou numa conversa, no portão da
casa da minha irmã , e , entre
outras coisas , disse que os médicos
eram todos uns jumentos , que não sabiam nada , que eram incompetentes , etc . Contou que ele tinha voltado a sentir o
mesmo problema que o levara ao hospital mas que
tinha resolvido o assunto por conta própria e que se sentia muito bem .
Disse que havia tomado uma Benzetacil e que todas as dores que o estavam
incomodando , haviam passado...
Três dias
depois, morreu !
Sarnelli,
25.07.2014
Postado por
Sarnelli às 03:30 Nenhum comentário:
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